26.02.25
Maria - Memórias de uma Vida (conto)
Maroussia
Estando Maria nas suas lides domésticas, toca a sineta da Sra. De imediato dirige-se à sala onde está o um velho piano (pouco afinado) com a sua banqueta de veludo, a estante dos livros, uma senhorinha acetinada, um pouco gasta, com um candeeiro de pé alto ao lado e algumas poltronas, que rodeiam um mesa redonda, onde as visitas tomam chá e convivem.
Maria, pergunta delicadamente, que deseja minha Sra. ? Um cházinho talvez ou estou errada ? ao que a Sra. lhe responde... olha que não estás totalmente errada (com um sorriso carinhoso), é realmente um chá, mas para duas pessoas, e já agora, ainda tens dos biscoitos que fizeste ontem ou os pequenos ao lanche deram conta deles ?
Tenho sim minha Sra. guardei-os na latinha da sua preferência, a que tem aquelas rosinhas em volta, responde Maria.
Sabes, é que vem cá a minha amiga Constança, porque quando falámos ao telefone, disse ter uma feliz novidade para dizer-me mas que gostava de fazê-lo pessoalmente, daí este convite para um chá, hoje pelas 5 horas.
Estou ansiosa por saber, pareço sempre uma criança, quando sei que tenho novidades boas para receber.
Eu sei bem disso minha Sra. sempre a conheci assim, desde o tempo do falecido Sr. Conservador, seu esposo, que adorava presenteá-la com surpresas.
Foi sempre uma "menina" muito mimada pelo Sr. seu esposo, por todos os familiares e amigos, até por mim que lhe quero muito bem e sinto uma gratidão enorme, apesar de ser uma simples serviçal.
Maria... não voltas a repetir tal patetice.
Nunca olhei para ti como tal, és da família. És tu que não queres que ninguém trate da casa, por minha vontade, a sra. que vem uma vez por semana para limpar a casa, vinha mais vezes, tu é que não queres, porque gostas de tudo sempre organizado à tua maneira.
Pois sim, minha Sra. bem o sei e grata estou, são muitos anos a seu lado. Desde tenra idade que me habituei à sua presença doce e serena, com um longo e lindo cabelo ruivo cacheadado e a tocar piano.
Eu era uma criança.filha dos caseiros dos seus paizinhos que Deus Haja, e a Sra. ainda era, a Menina Constança, como todos a tratavam.
Lembras tudo isso Maria ? diz a Sra. com um ar meio surpreso, porque pelas circunstancias da vida sempre ocupada e que lhe tomavam algum o tempo, entre as duas, as conversas eram mais triviais, embora sempre em tom ameno e empático.
Claro que sim minha Sra. ninguém esquece o passado e muito menos quem lhe quer bem. E lembro muito mais ainda; quando a Menina Constança (naquele tempo), entrava em nossa casa, quase sempre na altura em que a minha mãe preparava a broa e os e bolinhos para o forno.
Depois haviam conversas sobre as coisas que se íam passando. A "Menina" gostava muito de falar com a minha mãe, era quase como uma conselheira. Sei que a falou com ela do rapaz que viria a ser seu namorado, noivo e depois marido, antes de os seus paizinhos saberem.
Era filho de uns Senhores amigos de família, pessoas de "Posses". Era um bonito rapaz, de bom trato e já formado em Advocacia, naquele tempo.
Embora fosse 10 anos mais velho do que a "Menina" Constança, mal soube que era correspondido no "bem-querer" que sentia pela Sra. logo a pediu em casamento aos seus paizinhos.
Outros tempos, tudo tinha as suas regras. Casaram e vieram para Lisboa para esta mesma casa. Mal sabia a Sra. a minha tristeza quando a vi meter-se no carro. Os anos passaram, infelizmente os meus pais faleceram, segundo dizem com uma febre qualquer que houve naquele tempo.
Tinha os meus 15 anos quando isso aconteceu, os seus paizinhos olharam por mim mas, quando me leram uma carta da Sra. para me perguntar se eu queria ir para Lisboa para sua casa, foi o dia mais feliz da minha vida.
Continua ...
®M. Cabral (in - "Conto de ficção" )